segunda-feira, abril 25, 2011

“O BRASIL PRECISA DE MAIS PUTARIA, PERVERSÃO E UM CARALHO ARROMBADOR DE CU”






















Por Lauro Drummond

Lembra daquela febre brasileira de jogar bebês dentro da lagoa, dentro do bueiro, dentro da privada, dentro da fossa, dentro da usina hidroelétrica, dentro de qualquer coisa? Pois é, eu fui um desses bebês. Fui jogada lá dentro, dentro mesmo. Mas aí me acharam. Saí no jornal. Nome: Vitória. Todos os recém-nascidos jogados num buraco de bosta, chamavam-se, naquela época, Vitória. Fui mais uma.

Apesar de ter passado em cinco jornais diferentes da televisão, não fui adotada. Três anos depois, minha mãe, a Geralda, saiu da cadeia. Sabe-se lá por quê, o juiz, alegando que era função do Estado trazer o indivíduo para a sociedade, isto é, curando a gangrena social, deu-ma para ela novamente. Triste história. Vitória? Vitória dum caralho arrebentando o cu. Talvez.

Na infância ela dizia: “toma pinga, é bão prá alargá o rim”

Ela tinha uma cara de defunta, que dava dó, só vendo. Alargou tanto o rim, que o fígado não aguentou e saiu bem pelo cu. Vitória.

Mudei de casa. Meu pai, o Rarirama, um futebolista, que jogava num time da quarta divisão do Campeonato Brasileiro, passou a cuidar de mim. Rarirama. Para variar bebia, quando não tinha pinga, bebia perfume. Ficou conhecido como Cheiroso. Eu voltava da aula, diziam, melhor, gritavam: “OLHA A FILHA DO CHEIROSO!”

Meu pai, o Cheiroso, o Rarirama, dizia que meu nome dava sorte. Vitória. De fato, muita sorte. Um dia, voltando para casa, com o vidro de perfume na mão, um cachorro, que sofria de hidrofobia, atacou-o. Rarirama babou até morrer. No velório jogaram perfume em cima do caixão. A ideia do perfume adveio do Neca, meu Tio. Fui morar com ele. Vitória.

Neca gostava de criar cães, ele queria alugar cães. Era uma boa ideia, a do aluguel de cães, ele dizia. Sabe-se lá, por intervenção de Deus, ou de qualquer coisa, um cara, sem camisa, adentrou em nossa casa, esfaqueou os cachorros, depois meteu três tiros na testa do meu tio. Ninguém jogou perfume no velório. O cara, Riovaldo, tornou-se, depois, meu marido. Grande Vitória.

O Riovaldo, depois do enlace matrimonial, consertou-se. Tínhamos até um cachorro, o Blufi. Riovaldo trabalhava como garçom. Eu, por minha vez, tornei-me frentista. Num dia, sabe-se lá por que, Riovaldo resolveu assaltar o posto, meteu três tiros na minha perna, levou a grana. Não esqueço das palavras dele, quando o vi, com dinheiro dentro da bermuda, subindo na moto.

“O BRASIL PRECISA DE MAIS PUTARIA, PERVERSÃO E UM CARALHO ARROMBADOR DE CU”

Vitória. Gosto de ver os recortes dos jornais desbotados espalhados aqui no corredor do hospital.
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