sábado, abril 06, 2019

EXTEMPORÂNEO - UM POETA FIRME- DELALVES COSTA









Delalves Costa- arquivo do autor *













...
Suicida-se o poeta de asas na bunda, 
datilografa a puta, suja de encanto. 
Seus olhos de vinho 
derramados no anjo 
que cegos não falam 
a língua dos fatos... 





Entendo como poesia, entre outras tantas concepções, o sonho, o delírio do poeta, um desejo da condição de fricção por estar e ser; é isto com todo humano, marcar-se, e nisto flagra-se o dentro e o fora.

Acomodo a poesia como uma espécie de dizedura que não traduz o mundo, o homem, mas dessufoca e cria um real inatingível, mas que amolece com o que dizemos, o que se diz real. Desatamano-nos ou seu contrário, a língua na criação, e nos humanizamos. A palavra é afeto e o poema a busca do conatus, como diria Spinoza.

A poesia é o desejo de poder traduzir o intraduzível, e nisto a linguagem cumpre um papel de expansão como um bom inchaço. A palavra engorda, ou se enverga mais magra, todavia amplia-se para o querer ser e dizer.

Delalves Costa -Osório, RS/1981. É um poeta gaúcho que já tem uma língua e palavra esperta nas suas obras já postas. Seu novo livro “Extemporâneo” (Ed Coralina, 2019) tece nova trama em que alterna-se seu rugido de poeta na busca de seu estilo. A poesia é isto: busca nada, é definitivo.

Costa tem músculos fortes, mas por vezes duvida, como assim sempre é com quem escreve, digo isto ao perceber a sua ruptura do dito real, ora com, ora sem sombras de outros poetas, e aí surge sua criação qual estampido novo.

Os relógios suam, 
fedem à poeira. 
Desperto, homem sono em claro. 

Em sendo delirante, enquanto poeta, ele usa das ferramentas que tem – o vocábulo e suas devidas ubicações e revolteios lexicais.


O ritmo na soleira do poema 
me inventa... 
A formiga bebe a goteira 
na ranhura, 
arrasta o rio 
pelo silêncio, 
acorda a página e me define. 

Reafirmo, redigo: Delalves sabe de sua indecisão e ao dizê-la faz a sua assunção de poeta com vigor, sem precisar de sombras de árvores falantes já comidas e digeridas como entre outros: Drummond.



Inconcluso – o Homendereço 

No impulso onde se oculta à razão, 
os meus con(fusos disfarces). Me sinto estranho 
a conceitos que outrora repudiava. 
Parte do intelectual está homendereço. Se penso 
se não obedeço ou então me afasto 
dos vultos é meu dilema! Pra cada 
instante uma evidência: indecisão me consome. 
Aliás – vegeto morto-sobrevivente 
ou pertenço ao futuro? Do relógio o pior veneno: 
adoeço no ventre (na mente), de lógica e de caos 


E ele vai e vai... e se fortalece ao trapezear no verso e nisto sua musculatura amalgamada de coragem ao sustentar sua palavra ensalivada o faz pegar o outro lado do trapézio poemático.


O Invento 

O ritmo na soleira do poema 
me inventa... 
A formiga bebe a goteira 
na ranhura, 
arrasta o rio 
pelo silêncio, 
acorda a página e me define. ...

Ao adensar sua coragem vocabular e seu desenredo com não tessituras já consagradas ele pulula forte e mostra o novo com o aço no fogo poemático. Dito de outro modo, o poeta nas rupturas, nos seus buracos escondidos, despeja-se forte.

Seu relógio sem ponteiros é mais exato, creia! Tu sabes apalavrar em suavidade, não temas!

Digo sem temor: há um poeta em curso que merece ser lido e viajado em seus alcances múltiplos.





* Delalves Costa (13 de dezembro, 1981 – Osório-RS) é poeta e escritor com participação em coletâneas e 7 livros de poesia publicados, os mais recentes “Inacabamento, a eterna gestação” (2016, Pragmatta) e “O Apanhador de Estrelas” (Class, 2018). Membro e sócio-fundador da Academia dos Escritores do Litoral Norte (AELN/RS).

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